quinta-feira, 7 de setembro de 2017

Me apaixonei por uma ilusão.

Me apaixonei por uma ilusão!
 Na minha adolescência, ao finalmente me apaixonar por uma mulher vivi uma felicidade indescritível por compreender que eu não era incapaz de amar, apenas estava tentando encontrar amor no lugar errado, no caso, nos garotos que convivia.
 Vivi uma grande libertação da realidade que a muito me assombrava, não compartilhar com minhas amigas a mesma empolgação e nunca ter sentido nada além de um certo carinho pelos garotos que eu tentava me relacionar.
 Bom, acontecida a descoberta acreditei que tudo ficaria mais calmo. Claro eu teria que lidar com preconceito contra as relações homoafetivas e tudo mais, mas se existisse amor, seria genuíno e venceria qualquer perrengue.

 Primeira grande fantasia foi acreditar que amor era algo que simplesmente existia. Eu nunca tinha prestado atenção no fato de que amor da um trabalho do louco pra se manter, porque na verdade até aquele ponto tudo que eu conhecia era paixão.
 A minha ideia de amor era absolutamente trovadoresca, "ame o impossível, conquiste o amor daquele que nunca te entregará o amor totalmente , pois assim você estará sempre na busca por amor e sempre ganhará o amor, pois na hora que parar de buscar o amor, simplesmente não o terá". E este amor na verdade era paixão.
 E o objeto dessa minha paixão era o que? O que era esse objeto de paixão sociedade??
 Era a porra do Feminino!!!
 Só que depois de desconstruir esse padrão comportamental trovadoresco, que fazia da minha vida afetiva romântica uma novela, e passar a viver uma relação muito mais feliz e satisfatória, me deparei com esse feminino pendurado no centro da minha fantasia romântica insistindo e resistindo a toda mudança e desconstrução que venho fazendo nos últimos anos.
 A esse ponto da minha vida tenho uma desconfiança muito forte de que na verdade o masculino e o feminino são majoritariamente performances que as pessoas escolhem executar. Algumas pessoas até gostam de algumas das atividades pautadas nessas personagens de homem ou de mulher e passam a se identificar tanto com suas performances que seriam capazes de morrer em nome dela, porque de fato elas passam a ser suas performances.

 Eis a ironia da minha vida, eu que sempre acreditei me apaixonar por pessoas que tinham em comum certa autenticidade e sinceridade, descobri que com o feminino ocupando o centro da minha fantasia amorosa, eu me apaixonei por uma ilusão, pois o feminino não existe, ele é apenas uma performance.

 Agora que esta descoberta esta feita eu vivo mais um vazio. Um vazio inédito em minha vida! Um vazio angustiante e em alguma medida amedrontador.
 Muitas perguntas me assolam:
 Este vazio precisa ser preenchido?
 Como preencher algo tão central?
 Existe um eros pulsante para além das fantasias?
 O que é possível?
 Será que de fato vivi essa desconstrução ou eu estou forçando ela a acontecer por alguma razão que ainda desconheço?

 Caralho! Essa vida é Foda!

Desfemininando o inmasculinismo, ao desmasculinizar o infemininismo

Nunca me identifiquei totalmente com o que me foi apresentado como feminino. Aos poucos fui me descolando do que era exigido de mim para representar esse tal feminino, e fui me identificando cada pouco mais com o tal do masculino, afinal nada me foi dado entre um e outro e se não me encaixava tanto em um só podia me encaixar noutro.
 Neste limbo, que eu não admitia estar construía a forte ilusão de traços de transexualidade. Por tempos trouxe no peito densidade contida da dúvida sobre minha identidade de gênero, sem partilhá-la com ninguém, por acreditar que como ainda era dúvida tudo que fariam os outros seria julgar-me sem noção, desvalorizar minha angustia e tornar-me ainda mais confusa.
 A poucos resolvi compartilhar com minha companheira e foi uma reviravolta em nossas vidas subjetivas. Mas muito diferente do meu julgamento inicial, ela me apoiou na minha duvida e me deixou navegar por alguns extremos da identificação com o masculino me dando espaço para perceber que eu também não me identifico com ... isso.

 Engraçado que ao ler esse escrito pode se parecer de uma pessoa que nunca se apropriou dos estudos que discursam sobre a verdade profunda de que o feminino e o masculino foram meras invenções sociais , como tantas outras, usadas para controlar a sociedade e etc etc etc... E o engraçado é que eu não li tanta coisa assim mesmo não,  porque existe coisa de mais escrita pelo mundo, mas li bastante, afinal eu queria mesmo entender, na esperança de que entendendo essas construções históricas, sociais, politicas, psicológicas e tudo mais, eu poderia sentir paz de ser quem sou, ou ao menos saber quem sou, finalmente e poder atuar no mundo.
 Parentese - Porque sim, eu sinto que de alguma maneira eu espero saber quem sou para poder atuar no mundo de fato, o que é uma completa burrice emocional, uma vez que milhões de pessoas fazem barbaridades por ai e também brilhanticidades sem terem a menor ideia de quem são e sem se preocuparem inclusive de fingirem ser o que não são para terem seus objetivos atingidos. - Parentense
 Bom, parenteses a parte, eu queria mesmo dizer no parágrafo anterior não-parentesal, que eu estudei bastante sobre o fato na tentativa de sanar uma angustia, e compreendi e concordo plenamente que feminino e masculino são construções da humanidade e deveriam ser transformados, mais ambicionamente quem sabe até superados.
 Maaaas!!! Eis a questão que eu acredito compor a principal base da hipocrisia no ser humano: Acreditar, defender, concordar, e até mesmo elaborar uma tese não é igual viver, ser.
 Eu acreditava e defendia, mas dentro de mim aquelas regras binárias todas faziam ecos tão fortes ao ponto de muitas vezes me deixarem desnorteada.
 Na verdade eu ainda vivo a desconstrução desses. Como é fácil falar e como é dificil de fato realizar as mudanças internas que realmente sustentam as desconstruções racionais.
 Uma vez ouvi a frase que a razão emburrece o homem. E como emburrece! Porquê levada muito a sério nos faz surda ao nosso próprio emocional, nos leva pra tão longe do que sentimos que passamos a usar da própria racionalidade para defender ou justificar nossa hipocrisia, e muitas vezes disfarçando e aprisionando cada vez mais nossos sentimentos para que ninguém perceba o quão hipócrita de fato somos.

 Eu gostaria de convidar ao mundo a se religar com seus sentimentos e temer menos suas próprias contradições. Mas como o único mundo que alcanço é o meu, me contentarei com a continuidade deste meu desafiador exercício de desmascarar a mim mesma e assim ir desfazendo minhas amarras.

segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Projeto de Eu

 Não aceito mais essa sua violência! Essa sua ideia de proteção que parte do principio de um mundo violento onde ter força física ou um código de conduta masculino são os únicos atributos que de fato são capazes de proteger.

 Não aceito mais essa sua arrogância intelectual que te faz me crer inocente, ou boba quando a compaixão está na base do meu raciocino, quando argumento contra sua estratégia egocêntrica de tirar vantagem para os seus iguais e para você com discursos distorcidos e reforçados pela lógica de competição.

 Não mais baixarei meus olhos ao ver teu olhar de ódio ou desaprovação diante de meu posicionamento contrário ao seu. Não cederei por medo de uma possível punição ou mesmo simples medo de perder o seu amor, por te desagradar. Se seu amor for tão infantil que não consiga lidar com nossas diferenças, meu amor próprio terá de aprender a ser mais maduro e bancar romper com algumas relações em minha trajetória de vida.

Não mais te considerarei o centro da minha vida, abrindo mão de sair com minhas amigas, vestir as roupas que inclusive você admira em outras mulheres. Não vou abrir mão do estudo e do desenvolvimento profissional com medo de te perder caso eu seja "mais" ou tenha "mais", como sua lógica de competição geralmente o faz ler.

Por favor, tente entender o que estou dizendo aqui. São tantos nãos em minhas frases porque ainda estou aprendendo a compô-las; ainda estou aprendendo a ser isso que agora é projeto.

Não me entenda errado. Não ache que ao não mais baixar os olhos, vou agir como você e o encarar com raiva, não ache que tão pouco vou fazer do sucesso financeiro e profissional uma obrigação e algo que esteja no centro da minha sensação de satisfação pessoal.

 Ao contrário. Eu quero o equilíbrio que toda essa divisão entre feminino e masculino me impediu de viver até hoje. Eu quero uma conexão com a terra, com o útero, com a criação e com o divino ao mesmo tempo que também quero a conexão com tigre e com a águia.


quarta-feira, 24 de maio de 2017

Um de meus dias Ruins

 Finalmente encontro com meu monstro:
A ideia de inconsciente

 Me assombra a anos, e foi se deslocando e se renomeando ao longo dos tempos. Sinto que em algum ponto da minha trajetória chamou-se Deus, junto a ideia de que era o grande punidor divino. Após algum tempo parece ter se chamado lei do carma, que era colhida e produzida a todo momento, absolutamente todo momento, e eis que depois de alguns anos em companhia da academia passou a ser nomeada por mim mesma de inconsciente.
 Maldita ideia! Maldita prisão.

 Não há um momento se quer que eu passe sem me questionar sobre o quão inútil minha existência é, e sobre como eu sou pouco merecedora de qualquer coisa na medida que nada faço. Acordo num dia ensolarado e nem uma bendita meditação consigo produz. Apenas produzo café e alimentação. Mais café que alimentação.
 Sou capaz de passar todo um dia sem nada fazer da minha existência, e apenas fazer algo motivada pela tentativa de esquiva da decepção do outro.

Lido muito mal com decepções. A vida toda! Sinto que não sei decepcionar, nem ao outro nem a mim mesma.
 E por tanto meu inconsciente o tempo todo me julga, estou a todo momento vivendo na possibilidade de fracasso que o futuro me reserva, porque de algum modo a historia dos meus pais me reserva esse futuro.

 Sou uma otimista rasa, que ao dar alguns passos adiante se afunda num mar de pessimismo. Me sinto proibida de seguir em frente e amaldiçoada por meu ancestrais. Penso em desistir todos os dias, e todos os dias desisto.

 Quando vêem potencial em mim e me dizem isso, algumas coisas eu até reconheço. Reconheço potencial em mim, mas de que adianta ter condição pulmonar para ser uma triatleta se não se tem as pernas e nem o desejo de se matar de treinar para me tornar uma???

 Em dias ruins, sinto como se a vida fosse um emaranhado sem sentido, um grande seriado de temporadas infinitas que alguma hora se tornará finito e eu ficarei frustrada por não ter tido conclusão alguma. Em dias ruins a vida parece apenas uma ferida em aberto.

segunda-feira, 1 de maio de 2017

Finalmente!

O inédito se dá em minha vida!
A espontaneidade das palavras me caírem para fora da boca, e eu tentando colher de volta os pedaços espalham pelo cômodo.
 Há muitos e muitos anos atrás as palavras poéticas eram para mim instrumento apenas para falar das belas histórias de amor que eu assistia acontecer ao meu redor, enquanto eu, oca, esvaziada da possibilidade de amar.
Há alguns anos sua função se modificou e tornou-se instrumento trovadoresco em busca da dama que jamais me dedicaria amor real, amor concreto. Assim sendo todos os meus escritos se focavam na lamentação da dificuldade do amor improvável.
 E o inédito acontece!
Estou eu. Agora. buscando usar as palavras para me construir.
 Inédita a espontaneidade que me assusta!
 Inédita a possibilidade de me escolher no mundo.

 Sempre me vi cobrada a fazer escolhas profissionais, no sentido de fazer apostas mais audaciosas e melhores investimentos nesta área de minha vida, afinal de contas eu sempre tive tanto potencial.
 Mas como pode alguém que ainda não sabe quem é conseguir fazer qualquer escolha desta ordem?
Eu estão caminhei a vida toda em busca de amor e aceitação. Apenas teria condições de existir no mundo se fosse amada e aceita como sou.
 Eis que encontrei uma amostra desse amor! E foi só então, só quando encontrei a garantia de ser amada como sou, não apenas nela, mas em quem fui me construindo a partir da nossa história que percebi que não sei quem sou!

 Passei a vida tentando me concertar. Tentando me fazer aceitar melhor o feminino que existe em mim, e usufruir de toda a possibilidade que o feminino me trás. Passei a vida negando um desejo emudecido de vestir como homem, e ser vista como homem.
 Passei a vida e a vida passou. Com quase trinta anos finalmente construo coragem pra fazer a pergunta que quer calar: "será que sou trans?!"

 Um mundo de possibilidades e insegurança se abrem!
Eu andava afirmando a mais de 5 anos justamente o oposto daquilo que agora desconfio.
Paralisia facial do lado esquerdo do rosto, as pesquisas me dizia que era questão com uma paralisação do masculino. Mas uma arrogância intelectual me dizia que aqueles escritos estavam errados e que apesar de o corpo seguir a lógica de o esquerdo ser masculino e o direito feminino, o rosto era algum outro simbolo. Somente hoje consigo conceber a possibilidade de sim, ter paralisado o masculino em mim.

 Quando depois de ter contado a meus pais sobre minha mais recente descoberta de orientação homossexual, vi qualquer possibilidade de masculinidade assombrada pelas palavras "Pelo amor de Deus, quer ficar com menina fica, eu não tenho nada a ver com quem você come ou deixa de comer, mas não vai achar que é homem e começar a se vestir de homem por aí!"

 Ser "lésbica" tinha sido aceito e eu deveria ser grata por isso, e fui. Acreditei piamente que ser aceita como uma mulher que gosta de outra mulher seria o suficiente para eu ser feliz. Mas ... Aqui estou eu, ainda em crise de identidade, ainda sem conseguir me sentir pertencente a nada, ainda sem lugar no mundo.

Mas finalmente dando voz a tudo que antes foi calado!

Caminharei por este caminho por sentir que é o certo, e caso não seja, continuarei caminhando por quantos caminhos errados forem preciso para finalmente chegar ao caminho certo.

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

DESILÊNCIO

Chego ao ápice da crise do desejo!

Não fui ensinada a desejar, fui ensinada apenas a cumprir. E o pouco desejo que foi me surgindo ao longo da trajetória, nascia no contraponto daquilo que era imposto.
 O único espaço para desejo foi o que era revelado na sombra da cobrança.

 Ao crescer ouvindo "Seja Feminina!", ou ouvia dizer de duas únicas condições existenciais: Ser feminina ou ser masculina.
 Quando me impunham que eu fosse feminina, a algum ponto eu entendi que aquela ordem nascia da falta de feminilidade em alguns comportamentos meus, e muito cedo entendi que então o que era de fato meu era exatamente o oposto da ordem, ou seja, ser masculina.
 E naturalmente aquele ia sendo o "desejo-de-eu", fui me construindo na luz do que era dito sobre mim, que ia sendo internalizado na medida que eu me reconhecia naquilo, e na sombra do que me era ordenado, na medida em que falava das coisas que existiam em mim, mas não eram muito adaptadas ao que era esperado de uma garota.

 O problema é que na imaturidade do inicio da vida, eu fui levando esses ditos cada vez mais a ferro e fogo, e em dado momento me vi presa numa redoma de palavras que me aprisionavam numa identificação massiva com o masculino mesclada a uma série de obrigações com o cuidado, a maternidade e tantas outras características socialmente impostas ao feminino, inclusive a dificuldade de usar da minha agressividade para galgar espaços profissionais.

 Foi então que em algum momento eu consegui destruir essa prisão. Mas o que as prisões causam em nossas vidas? Quais são as consequência para aqueles que após anos de enclausuramento se vêm soltos nas ruas, e com infinitas possibilidades de exercer suas liberdades?
 Bom, eu me vi perdida.

Algumas marcas dessas prisões ainda me acompanham, mas jã não são o suficiente para me impedirem de caminhar. Mas me ponho na calçada, sentada ao chão. E choro.
Não sei para onde ir. Não sei para onde quero ir. E também não sei pedir ajuda.
Ouço relatos daqueles que pedem ajuda e de fato caminham muito neste mundo, mas vejo esses relatos em corpos masculinos e sinto uma dificuldade enorme de acreditar que conseguiria ajuda.

 Pela primeira vez em minha vida reconheço o feminino em mim como potência, e no entanto, não sei para onde caminhar. Não sei muito bem quem sou, mais. Não sei o que desejo; Os meus sonhos parecem vagos e muito distantes de mim; O Deus todo poderoso parece não mais operar em minha existência na medida em que me encontro com a Sagrado Feminino, e pela primeira vez em minha vida me sinto completamente impotente e sem poder criador e concretizador.

 As ironias que nos cercas... O Sagrado Feminino, o poder universal da criação, da condição da existência de tudo, poder da terra, transformador e amoroso, e eu sentindo me impotente.

 Eu caminhava num caminho falso, idealizado por um eu masculinizado e distante da minha própria verdade interior. Um eu que precisava sobreviver a violência e outras condições adversas da vida, e que para tanto, como mulher, aprendeu a andar com gingado malandro e cara fechada dentre bairros de alto índice de criminalidade, um eu que pouco a pouco me habita menos e menos, e com o qual eu já cumpro as despedidas.
 Frente a isso, parece tão obvio que os caminhos irão mudar drasticamente, parece tão claro que os lugares para que eu estava caminhando agora, passarão a aos poucos se dissolverem em meu caminho, para que outras possibilidades surjam.
 Mas na medida em que assisto e vivo tudo isso, não consigo ter a calma e a sutileza que as linhas anteriores traduzem. Eu me desespero, me recuso, me repudio. Eu choro.

 Eu choro porque estou com fome. Fome de vida genuína. Fome de saber melhor quem eu sou.
 Fome de mim!

terça-feira, 11 de outubro de 2016

DESCONCERTO!

Nasci MULHER
Com os nãos prontos para me serem dados.
Fui ensinada a cuidar e a restaurar.
"Restaure. Concerte tudo que puder. É nisso que és boa, és boa em concertar pessoas."

 Primeira mentira!!

Estou exausta dos concertos! Essa história cansativa de compor melodias menos pavorosas, de harmonizar e criar escalas que se encaixem e sejam belas...

 Estou de saco cheio da mentira que contei pra mim mesma.
 Estou de saco cheio de acreditar que preciso de outra pessoa para ter permissão de ser eu mesma.

 Chega!

Não sei quem sou, mas não serei mais quem concerta coisa alguma!