quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Esse nó

Eu pude vê-la aos poucos afrouxando os dedos que entrelaçavam os meus, senti então suas mãos se abrindo e deslizando nas minhas.
 Abri os olhos!
 Ela estava partindo e eu não podia continuar confiando. 
Já com as mãos distantes das minhas ela dizia: "Não estou partindo. Estou aqui, mas você não é capaz de sentir, o que te dou não é suficiente!"
 De olhos muito abertos, agora, eu gritei: "VOCÊ NÃO PERCEBE QUE ESTÁ NOS MATANDO?"







Errei. Ela estava se distanciando. Então então a vi correr para longe, tão mais longe quanto o resistente amor por mim a permitiu ir. De longe ela gritou para que eu pudesse escutar em sussurro: "Eu não aguento mais ficar perto. Preciso ir para que possa continuar a ser quem quero ser." 
Eu, ainda com os braços estirados na direção dela, ainda esperando sua mão na minha, ainda parada sem saber se deveria dar um passo para frente ou para trás. 
 Abaixei os braços, a olhei e a vi chorar. Nunca entendi seu olhar daquele momento. 

 Ela insistia em gritar, vez ou outra: "EU AMO VOCÊ". Até hoje não compreendi seu choro copioso. Eu estava lá, não havia morrido. Talvez ela chorasse o amor que recebera a notícia do câncer, talvez ela chorasse por sentir-se culpada por ter sido ela quem terminou, talvez ela chorasse... Na verdade essa era a única certeza: ela chorava. 

 Cansei de ficar em pé a sua espera, sentei na areia, e a observo: a cada onda do mar ela se distancia um pouco mais. Vezes ela se vira de costas para mim, e posso ouvir sua gargalhada dos prazeres supérfluos da vida (os mesmos que pareci tentar lhe privar o direito). E então sou eu que dou-lhe as costas, mas rio das possibilidades de vivências dos prazeres supérfluos do futuro.

Ela está lá. Eu estou aqui. O mundo me exige mais e cada vez mais, e estou paralisada. Chego a me questionar o quanto sou realmente capaz de estar só. Dói, mas é uma dor muda, então não a ouço e não olho para ela, apenas estou paralisada por ela. 

 Eu me iludo de que ela esta mais perto do que minha visão me confirma. Eu alucino sua presença em rostos desconhecidos, cabelos longos que apenas passam, silhuetas que são sombras de um desejo assassinado. Eu me iludo que ela ainda está perto, como que numa última tentativa de sanidade, como que em última tentativa de amor próprio. 

 Ela está longe. Ouço meu coração bater. Sinto o vento frio nos caminhos percorridos em meu rosto pelas lágrimas. 

 Sinto que logo menos não mais a verei, e tudo que conseguirei ouvir será o eco de minha própria voz. 

sábado, 8 de novembro de 2014

Ser

Se permitir ou se educar? 
Se jogar, se repensar, se criar, se melhorar, se saber, se perdoar, se julgar, se lamentar, se encorajar? Sonhar, realizar, criar, matar, desenhar, escrever,compor, apagar, parar, correr, pular, abaixar, esquivar, enfrentar? 
Estacionar, esperar, pensar? 
Agir, gritar, viver?

 A questão será mesmo ser ou não ser?

Talvez a questão seja o que ser. E então, como ser?
Vivo no ser ou não ser a prisão na dicotomia dos extremos. Vivo no ser ou não ser a morte de tudo que me é e não me é. De tudo em mim que compõe o meio, de tudo em mim que compõe o que as palavras que me cortam e me cindem não me deixar expressar.

 Sadios são os loucos que se esquecem das palavras e vivem a primorosidade das imagens. Sadios são os loucos que se negam a formatarem-se nas bordas frias e cortantes de uma sociedade fundada na hipocrisia e nas máscaras. Sadios são os loucos.  E louca sou eu.